Francisco Cândido Xavier |
Pelo Espírito Neio Lúcio |
Parte 05 |
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41 - O
incentivo santo |
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43 - A glória do esforço |
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44 - A lição do essencial |
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45 - O imperativo da ação |
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46 - A
árvore preciosa |
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48 - O
proveito comum |
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49 - A jornada redentora |
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50 - Em
oração |
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Aberta a
sessão de fraternidade em casa de Pedro, Tadeu clamou, irritado, contra as próprias
fraquezas, asseverando perante o Mestre:
Como ensinar a verdade se ainda me sinto inclinado à mentira? Com que títulos transmitir
o bem, quando ainda me reconheço arraigado ao mal? Como exaltar a espiritualidade divina,
se a animalidade grita mais alto em minha própria natureza?
O
companheiro não formulava semelhantes perguntas por espírito de desespero ou desânimo,
mas sim pela enorme paixão do bem que lhe tomava o íntimo, a observar pela inflexão de
amargura com que sublinhava as palavras.
Entendendo-lhe
a mágoa, Jesus falou, condescendente:
Um santo aprendiz da Lei, desses que se consagram fielmente à Verdade, chamado pelo
Senhor aos trabalhos da profecia entre os homens, mantinha-se na profissão de mercador de
remédios, transportando ervas e xaropes curativos, da cidade para os campos,
utilizando-se para isso de um jumento caprichoso e inconstante, quando, refletindo sobre
os defeitos de que se via portador, passou a entristecer-se profundamente. Concluiu que
não lhe cabia colaborar nas revelações do Céu, pelo estado de impureza íntima, e
fez-se mudo. Atendia às obrigações de protetor dos doentes, mas recusava-se a instruir
as criaturas, na Divina Palavra, não obstante as requisições do povo que já lhe
conhecia os dotes de inteligência e inspiração.
Sentido,
porém, que a Celeste Vontade o constrangia ao desempenho da tarefa e reparando que os
seus conflitos mentais se tornavam cada vez mais esmagadores, certa noite, depois de
abundantes lágrimas, suplicou esclarecimento ao Todo-Poderoso.
Sonhou,
então, que um anjo vinha encontrá-lo em suas lides de mercador. Viu-se cavalgando o
voluntarioso jumento, vergado ao peso de preciosa carga, em verdejante caminho, quando o
emissário divino o interpelou, com bondade, em seguida às saudações habituais:
Meu amigo, sabes quantos coices desferiu hoje este animal?
Muitíssimos respondeu sem vacilação.
Quantas vezes terá mordido os companheiros de estrebaria? prosseguiu o enviado,
sorridente quantas vezes terá insultado o asseio de tua casa e orneado
despropositadamente? E porque o discípulo aturdido não conseguisse responder, de pronto,
o anjo considerou:
Entretanto, ele é um auxiliar precioso e deve ser conservado. Transporta medicamentos que
salvam muitos enfermos, distribuindo esperança, saúde e alegria.
E
fitando os olhos lúcidos no pregador desalentado, rematou:
Se este jumento, a pretexto de ser rude e imperfeito, se negasse a cooperar contigo, que
seria dos enfermos a esperarem confiantes em ti? Volta à missão luminosa que
abandonaste, e, se te não é possível, por agora, servir a Nosso Pai Supremo na
condição de um homem purificado, atende aos teus deveres, espalhando reconforto e bom
ânimo, na posição do animal valioso e útil. nas bênçãos do serviço, serás mais
facilmente encontrado pelos mensageiros de Deus, os quais, reconhecendo-te a boa-vontade
nas realizações do amor, se compadecerão de ti, amparando-te a natureza e
aprimorando-a, tanto quanto domesticas e valorizas o teu rústico, mas prestimoso
auxiliar!
Nesse
instante, o pregador viu-se novamente no corpo, acordado, e agora feliz em razão da
resposta do Alto, que lhe reajustaria a errada conduta.
Surgindo
o silêncio, o discípulo agradeceu ao Mestre com um olhar. E Jesus, transcorridos alguns
minutos de manifesta consolação no semblante de todos, concluiu:
O
trabalho no bem é o incentivo santo da perfeição. Através dele, a alma de um criminoso
pode emergir para o Céu, à maneira do lírio que desabrocha para a Luz, de raízes ainda
presas no charco.
Em
seguida, o Mestre pôs-se a contemplar as estrelas que faiscavam, dentro da noite,
enquanto Tadeu, comovido, se aproximava, de manso, para beijar-lhe as mãos com doçura
reverente.
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Dentro
da noite clara, a assembléia familiar em casa de Pedro centralizara-se no exame das
dificuldades no trato com as pessoas.
Como
estender os valores da Boa Nova? Como instalar o mesmo dom e a mesma bênção em
mentalidades diversas entre si?
Findo o
longo debate fraternal,
Senhor, que fazer diante da calúnia que nos dilacera o coração?
Tem piedade do caluniador e trabalha no bem de todos respondeu o Celeste Mentor,
sorrindo , porque o amor desfaz as trevas do mal e o serviço destrói a idéia
desrespeitosa.
Mestre ajuntou Tiago, filho de Zebedeu , e como agir perante aquele que nos
ataca, brutalmente?
Um homem que se conduz pela violência acentuou o Cristo, bondoso , deve
estar louco ou envenenado. Auxiliemo-lo a refazer-se.
Senhor aduziu Judas, mostrando os olhos esfogueados , e quando o homem que
nos ofende se reveste de autoridade respeitável, qual seja a dum príncipe ou dum
sacerdote, com todas as aparências do ordenador consciente e normal?
A
serpente pode ocultar-se num ramo de flores e há vermes que se habituam nos frutos de
bela apresentação. O homem de elevada categoria que se revele violento e cruel é
enfermo, ainda assim. Compadece-te dele, porque dorme num pesadelo de escuras ilusões, do
qual será constrangido a despertar, um dia. Ampara-o como puderes e marcha em teu
caminho, agindo na felicidade comum.
Mestre, e quando a nossa casa é atormentada por um crime? Como procederei diante daquele
que me atraiçoa a confiança, que me desonra o nome ou me ensangüenta o lar?
Apiada-te do delinqüente de qualquer classe elucidou Jesus e não desejes
violar a Lei que o próximo desrespeitou, porque o perseguidor e o criminoso de todas as
situações carrega consigo abrasadora fogueira. Uma falta não resgata outra falta e o
sangue não lava sangue. Perdoa e ajuda. O tempo está encarregado de retribuir a cada
criatura, de acordo com o seu esforço.
Mestre atalhou Bartolomeu , que fazer do juiz que nos condena com
parcialidade?
Tem compaixão dele e continua cooperando no bem de todos os que te cercam. Há sempre um
juiz mais alto, analisando aqueles que censuram ou amaldiçoam e, além de um horizonte,
outros horizontes se desdobram, mais dilatados e luminosos.
Senhor indagou Tadeu , como proceder diante da mulher que amamos, quando se
entrega às quedas morais?
Jesus fitou-o com brandura, e inquiriu, por sua vez:
Os sofrimentos íntimos que a dilaceram, dia e noite, não constituirão, por si só,
aflitiva punição?
Fez-se
balsâmico silêncio no círculo doméstico e, logo ao perceber que os aprendizes haviam
cessado as interrogações, o Senhor concluiu:
Se pretendemos banir os males do mundo, cultivemos o amor que se compadece no serviço que
constrói para a felicidade de todos. Ninguém se engane. As horas são inflexíveis
instrumentos da Lei que distribui a cada um, segundo as suas obras. Ninguém procure sanar
um crime, praticando outros crimes, porque o tempo tudo transforma na Terra, operando com
as labaredas do sofrimento ou com o gelo da morte.
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Relacionava
Tiago, filho de Alfeu, as dificuldades naturais na preparação do discípulo, quando
várias opiniões se fizeram ouvir quanto aos percalços do aprimoramento.
É quase
impossível praticar as lições da Boa Nova, no mundo avesso à bondade, à renúncia e
ao perdão concluíram os aprendizes de maneira geral. A maioria das criaturas
comprazem-se na avareza ou no endurecimento.
Registrava
o Mestre a conceituação expendida pelos companheiros, em significativa quietude, quando
Pedro O convocou diretamente ao assunto.
Jesus
refletiu alguns instantes e ponderou:
Entre ensino e aproveitamento, tudo depende do aprendiz.
E a
seguir, falou com brandura:
Existiu no tempo de David um grande artista que se especializara na harpa com tamanha
perfeição que várias pessoas importantes vinham de muito longe, a fim de ouvi-lo.
Grandes senhores com as suas comitivas descansavam, de quando em quando, junto à moradia
dele, cercada de arvoredo, para escutar-lhe as sublimes improvisações. O admirável
mestre fez renome e fortuna, parecendo a todos que ninguém o igualaria na Terra na
expressão musical a que se consagrara.
Em seus
saraus e exibições, possuía em seu serviço pessoal um escravo aparentemente inábil e
atoleimado, que servia água, doce e frutas aos convivas e que jamais conversava, fixando
toda a atenção no instrumento divino, como se vivesse fascinado pelas mãos que o
tangiam.
Muitos
anos correram quando, certa noite, o artista volta, de inesperado, ao domicílio, findo o
banquete de um amigo nas vizinhanças e, com indizível espanto, assinala celeste melodia
no ar.
Alguém
tocava magistralmente em sua casa solitária, qual se fora um anjo exilado no mundo.
Quem
seria o estrangeiro que lhe tomara o lugar?
Em
lágrimas de emoção por pressentir a existência de alguém com ideal artístico muito
superior ao dele, avança devagar para não ser percebido e, sob intraduzível assombro,
verificou que o harpista maravilhoso era o seu velho escravo tolo que, usando os minutos
que lhe pertenciam por direito e sem incomodar a ninguém, exercitava, as lições do
senhor, às quais emprestava, desde muito tempo, todo o seu vigilante amor em comovido
silêncio.
Foi
então que o artista magnânimo e famoso libertou-o e conferiu-lhe a posição que por
justiça merecia.
Diante
da estranheza dos discípulos que se calavam, confundidos, o Mestre rematou:
A
aquisição de qualidades nobres é a glória infalível do esforço. Todo homem e toda
mulher que usarem as horas de que dispõem na harpa da vida, correspondendo à sabedoria e
à beleza com que Nosso Pai se manifesta, em todos os quadros do mundo, depressa lhe
absorverão a grandeza e as sublimidades, convertendo-se em representantes do Céu para
seus irmãos
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Discorriam
os discípulos, entre si, quanto às coisas essenciais ao bem-estar, quando o Senhor,
assumindo a direção dos pensamentos em dissonância, acrescentou:
É indispensável que a criatura entenda a própria felicidade para que se não
transforme, ao perdê-la, em triste fantasma da lamentação. Longe das verdades mais
simples da Natureza, mergulha-se o homem na onda pesada de fantasiosos artifícios,
exterminando o tempo e a vida, através de inquietações desnecessárias.
E como
quem recordava incidente adequado ao assunto, interrompeu-se por alguns instantes e
retomou a palavra, comentando:
Ilustre dama romana, em companhia dum filhinho de cinco anos, dirigia-se da cidade dos
Césares para Esmirna, em luxuosa galera de sua pátria. Ao penetrar na embarcação,
fizera-se acompanhar de dois escravos, carregados de volumosa bagagem de jóias
diferentes: colares e camafeus, braceletes e redes de ouro, adornados com pedrarias,
revelavam-lhe a predileção pelos enfeites raros. Todo o pessoal de serviço inclinou-se,
com respeito, ao vê-la passar, tão elevada era a expressão do tesouro que trazia para
bordo.
Tão
logo se fez o barco ao mar alto, a distinta senhora converteu-se no centro das atenções
gerais. Nas festas de cordialidade era o objetivo de todos os interesses pelos adornos
brilhantes com que se apresentava.
A
excursão prosseguia tranqüila, quando, em certa manhã ensolarada, apareceu o
imprevisto. O choque em traiçoeiro recife abre extensa brecha na galera e as águas a
invadem. Longas horas de luta surgem com a expectativa de refazimento; entretanto, um
abalo mais forte leva o navio a posição irremediável e alguns botes descidos são
colocados à disposição dos viajantes para os trabalhos de salvamento possível.
A
ilustre patrícia é chamada à pressa.
O
comandante calcula a chegada a porto próximo em dois dias de viagem arriscada, na
hipótese de ventos favoráveis.
A jovem
matrona abraça o filhinho, esperançosa e aflita. Dentro em pouco ela atinge o pequeno
barco de socorro, sustentando a criança e pequeno pacote em que os companheiros julgaram
trouxesse as jóias mais valiosas. Todavia, apresentando o conteúdo aos poucos irmãos de
infortúnio que seguiriam junto dela, exclamou:
Meu filho é o que possuo de mais precioso e aqui tenho o que considero de mais
útil. O insignificante volume continha dois pães e dez figos maduros, com os quais
se alimentou a reduzida comunidade de náufragos, durante as horas aflitivas que os
separavam da terra firme.
O Mestre
repousou, por alguns segundos, e acrescentou:
A
felicidade real não se fundamenta em riquezas transitórias, porque, um dia sempre chega
em que o homem é constrangido a separar-se dos bens exteriores mais queridos ao
coração. Os loucos se apegam a terras e moinhos, moedas e honras, vinhos e prazeres,
como se nunca devessem acertar contas com a morte. O espírito prudente, porém, não
desconhece que todos os patrimônios do mundo devem ser usados para nosso enriquecimento
na virtude e que as bênçãos mais simples da Natureza são as bases de nossa
tranqüilidade essencial. Procuremos, pois, o Reino de Deus e sua justiça, tomando à
Terra o estritamente necessário à manutenção da vida física e todas as alegrias
ser-nos-ão acrescentadas.
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Explanavam
os aprendizes, acaloradamente, sobre as necessidades de preparação para o Reino Divino.
Filipe,
circunspecto, salientava o impositivo da meditação. Tiago, o mais velho, opinava pelo
retiro espiritual; os discípulos do movimento renovador, a seu ver, deviam isolar-se em
zona inacessível ao pecado. João optava pela adoração constante, chegando ao extremo
de sugerir o abandono das atividades profissionais, por parte de cada um, a fim de poderem
entoar hosanas contínuos ao Pai Amantíssimo. Bartolomeu destacava a necessidade do jejum
incessante, com abstenção de todo contacto com as pessoas impuras.
Chamado
à manifestação direta pela palavra indagadora de Simão, Jesus perguntou, nominalmente:
Pedro, qual é a água que desprende miasmas pestilenciais?
Sem dúvida respondeu o apóstolo, intrigado , é a água estagnada, sem
proveito.
Sorridente,
dirigiu-se ao filho de Alfeu, indagando:
Tiago, qual é o peixe que flutua inerte na onda?
É o peixe morto, Senhor redargüiu o discípulo, desapontado.
Bartolomeu, qual é a terra que se enche de matagais daninhos à plantação útil?
O
interpelado pensou, pensou e esclareceu:
Indiscutivelmente, é a terra boa desprezada, porque o solo empedrado e áspero é quase
sempre estéril.
O
Mestre, evidenciando sincera satisfação, concentrou a atenção em Tadeu e inquiriu:
Tadeu,
qual é a túnica que se converte em ninho da traça destruidora?
É a túnica não usada.
Endereçando
expressivo gesto a Judas, interrogou:
Que acontece ao talento sepultado?
Perde-se por inútil, Senhor.
Logo
após, assinalou com o olhar um dos filhos de Zebedeu e falou, mais incisivo:
Tiago, onde se acoitam as serpentes e os lobos?
Nos lugares em ruína ou votados ao abandono.
André disse o Cristo, fixando o irmão de Pedro , qual é, em verdade, a
função do fermento?
Mestre, a missão do fermento é dar vida ao pão.
Em
seguida, pousando nos companheiros o olhar penetrante e doce, acrescentou, bem-humorado:
O tempo
está repleto de adoradores e a miséria rodeia Jerusalém. Se a luz não serve para
expulsar as trevas, se o pão deve fugir ao faminto e se o remédio precisa distanciar-se
do enfermo, onde encontraremos proveito no trabalho a que nos propomos? O Reino Divino
guarda o imperativo da ação por ordem fundamental. Sigamos para diante e propaguemos a
verdade salvadora, através dos pensamentos, das palavras, das obras e de nossas próprias
vidas. O Todo-Sábio criou a semente para produzir com o infinito. Desce do alto a
claridade do Sol cada dia para extinguir as sombras da Terra. Não é outro o ministério
da Boa Nova. Amar, servindo, é venerar o Pai, acima de todas as coisas; e servir, amando,
é amparar o próximo como a nós mesmos. Pautar-se por estas normas, em nosso movimento
de redenção, é praticar toda a Lei.
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Salientando
o Senhor que a construção do Reino Divino seria obra de união fraternal entre todos os
homens de boa-vontade, o velho Zebedeu, que amava profundamente os apólogos do Cristo,
pediu-lhe alguma narrativa simbólica, através da qual a compreensão se fizesse mais
clara entre todos.
Jesus,
benévolo como sempre, sorriu e contou:
Viviam os homens em permanentes conflitos, acompanhados de miséria, perturbação e
sofrimento, quando o Pai compadecido lhes enviou um mensageiro, portador de sublimes
sementes da Árvore da Felicidade e da Paz. Desceu o anjo com o régio presente e,
congregando os homens para a entrega festiva, explicou-lhes que o vegetal glorioso
produziria flores de luz e frutos de ouro, no futuro, apagando todas as dissensões, mas
reclamava cuidados especiais para fortalecer-se. Em germinando, era imprescindível a
colaboração de todos, nos cuidados excepcionais do amor e da vigilância.
As
sementes requeriam terra conveniente, aperfeiçoado sistema de irrigação, determinada
classe de adubo, proteção incessante contra insetos daninhos e providências diversas,
nos tempos laboriosos do início; a planta, contudo, era tão preciosa em si mesma que
bastaria um exemplar vitorioso para que a paz e a felicidade se derramassem, benditas,
sobre a comunidade
Finda a
promessa e depois de confiadas ao povo as sementes milagrosas, cada circunstante se
retirou para o domicílio próprio, sonhando possuir, egoisticamente, a árvore das flores
de luz e dos frutos de ouro. Cada qual pretendia a preciosidade para si, em caráter de
exclusividade. Para isso, cerraram-se, apaixonadamente, nas terras que dominavam,
experimentando a sementeira e suspirando pela posse pessoal e absoluta de semelhante
tesouro, simplesmente por vaidade do coração.
A
árvore, todavia, a fim de viver, reclamava concurso fraterno total, e os atritos ruinosos
continuaram.
As
sementes, pela natureza divina que as caracterizava, não se perderam; entretanto, se
alguns cultivadores possuíam água, não possuíam adubo e os que retinham o adubo não
dispunham de água farta. Quem detinha recursos para defender-se contra os vermes, não
encontrava acesso à gleba conveniente e quem se havia apoderado do melhor solo não
contava com possibilidades de vigilância. E tanto os senhores provisórios da água e do
adubo, da terra e dos elementos defensivos, quanto os demais candidatos à posse da
riqueza celeste, passaram a lutar, em desequilíbrio pleno, exterminando-se
reciprocamente.
O Mestre
fez longo intervalo na curiosa narrativa e acrescentou:
Este é o símbolo da guerra improfícua dos homens em derredor da felicidade. Os talentos
do Pai foram concedidos aos filhos, indistintamente, para que aprendam a desfrutar os dons
eternos, com entendimento e harmonia. Uns possuem a inteligência, outros a reflexão; uns
guardam o ouro da terra, outros o conhecimento sublime; alguns retêm a autoridade, outros
a experiência; todavia, cada um procura vencer sozinho, não para disseminar o bem com
todos, através do heroísmo na virtude, mas para humilhar os que seguem à retaguarda.
E
fitando Zebedeu, de modo significativo, finalizou:
Quando a verdadeira união se fizer espontânea, entre todos os homens no caminho redentor
do trabalho santificante do bem natural, então o Reino do Céu resplandecerá na Terra,
à maneira da árvore divina das flores de luz e dos frutos de ouro.
O velho
galileu sorriu, satisfeito, e nada mais perguntou.
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Comentava
André, o apóstolo prestativo, as dificuldades para afeiçoar-se às verdades novas,
quando Jesus narrou para a edificação de todos:
Um homem, singularmente forte, que se especializara em variados serviços de reparação e
reajustamento, foi convidado por um anjo a consertar um aleijado que aspirava ao ingresso
no paraíso e aceitou a tarefa.
Avizinhou-se
do enfermo, de martelo em punho, e, não obstante os gritos e lágrimas que a sua obra
arrancava do infeliz, aprimorando-o, dia a dia, cumpriu o prometido.
O
mensageiro divino, satisfeito, rogou-lhe a contribuição no aperfeiçoamento de uma velha
coxa que desejava ardentemente a entrada na Corte Celeste.
O
trabalhador robusto, indiferente aos gemidos da anciã, impôs-lhe a disciplina curativa
e, gradativamente, colocou-a em condições de subir às Esferas Sublimes.
O
ministro do Alto, jubiloso, solicitou-lhe o concurso no refazimento de um homem chagado e
aflito que anelava a beatitude edênica.
O
consertador não hesitou.
Absolutamente
inacessível aos petitórios do infortunado, queimou-lhe as úlceras com atenção e
rigor, pondo-o em posição de elevar-se.
Terminada
a tarefa, o anjo retornou e requisitou-lhe a cooperação em benefício de um jovem
perdido em maus costumes.
O
restaurador tomou o rapaz à sua conta e deu-lhe trabalho e contenção, com tamanho
tirocínio, que, em tempo breve, a tarefa se fazia completa.
E,
assim, o emissário de Cima pediu-lhe colaboração em diversos casos complexos de
reestruturação física e moral, até que, um dia, o emérito educador, entediado da
existência imperfeita na Terra, implorou ao administrador angélico a necessária
permissão para seguir em companhia dele, na direção do Céu.
O
embaixador sublime revistou-o, minuciosamente, e informou que também ele devia
preparar-se com vistas ao grande cometimento; mostrou-lhe os pés irregulares, os braços
deficientes e os olhos defeituosos e rogou, dessa vez, reajustasse ele a si mesmo, a fim
de elevar-se.
O
disciplinador começou a obra de auto-aprimoramento, esperançoso e otimista; entretanto,
o seu antigo martelo lhe feria agora tão rudemente a própria carne que ele, ao invés de
consertar os pés, os braços e os olhos, caiu a contorcer-se no chão, desditoso e
revoltado, proferindo blasfêmias e vomitando injúrias contra Deus e o mundo, quase
paralítico e quase cego.
Ele
mesmo não suportara o regime de salvação que aplicara aos outros e o próprio anjo
amigo, ao reencontrá-lo, com extrema dificuldade o identificou, tão diferente se achava.
Findo o
longo exame a que submeteu o infortunado, o mensageiro do Eterno não teve outro recurso
senão confiá-lo a outros educadores para que o reajustamento necessário se fizesse, com
o mesmo rigor salutar com que funcionara para os outros, a fim de que o notável
consertador se aperfeiçoasse, convenientemente, para, então, ingressar no Paraíso.
Diante
da estranheza que senhoreara o ânimo dos presentes, o Senhor concluiu:
Usemos de paciência e amor em todas as obras de corrigenda e aprendamos a suportar as
medidas com que buscamos melhorar a posição daqueles que nos cercam, porque para cada
espírito chega sempre um momento em que deve ser burilado, com eficiência e segurança,
para a Luz Divina.
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Dentro
da noite muito clara, os companheiros reunidos em casa de Pedro comentavam as dificuldades
na divulgação das idéias redentoras.
Muita
gente se valia do socorro de Jesus, buscando vantagens próprias. Certo negociante
provocava o ajuntamento popular em determinada região da praia, a fim de estimular a
venda de vinhos; carroceiros vulgares intensificavam a propaganda do Reino Celeste, nas
cercanias, não com o objetivo de se tornarem melhores, mas para alugarem veículos
diversos a doentes de longe, interessados na assistência do Mestre.
O
parecer de quase todos os apóstolos era inquietante e desalentador.
Foi
quando o Divino Amigo, tomando a palavra, explanou:
Certo filósofo, mergulhado nos estudos da Revelação Divina, possuía um discípulo que
nunca se conformava com a incompreensão do povo quanto às verdades celestes.
Inflamava-se, de minuto a minuto, contra os maus, os ingratos ou os hipócritas, que
abusavam dos elevados ensinamentos de que se via portador.
O mestre
ouvia-o e guardava silêncio, até que numa linda manhã, vindo um aguaceiro rápido de
estio, convidou-o para um breve passeio até o campo próximo, depois de refeita a
paisagem.
Não haviam andado meia-milha, quando avistaram vasta faixa de
pântano; e o orientador, observando que o charco recebia a água da chuva, explicou:
Eis que o lodaçal recolhe o líquido celeste e com ele faz imundo caldo, mas existem
batráquios que se beneficiarão com segurança e eficiência, porquanto, se não
chovesse, provavelmente estas águas escuras se transformariam em veneno mortal.
Depois
de alguns passos, encontraram poças de enxurrada nos recôncavos de terra dura, e o
mentor, analisando-as, acrescentou:
Aqui, a fonte jorrada do firmamento é agora lama desagradável; entretanto, que seria
deste chão estéril se a água divina o não visitasse? Amanhã, talvez veremos neste
solo perfumada floração de lírios rústicos.
Marcharam
adiante e detiveram-se na contemplação de algumas árvores nuas. A água, nos galhos
ressequidos, parecia cinzenta e fétida, mas o instrutor esclareceu:
Nestas árvores abandonadas, a bênção da chuva cristalina se fez pesada e sombria; no
entanto, que lhes aconteceria se as dádivas do Alto as não beneficiassem? Possivelmente,
morreriam, em breve, até às raízes. Em poucas semanas, porém, cobrir-se-ão de
ramagens fartas, servindo aos lares abençoados dos passarinhos.
Demandaram
além e descobriram alguns pessegueiros, cujas flores guardavam as gotas do céu, com
tanta beleza, que mais se assemelhavam, dentro delas, a diamantino orvalho, levemente
irisado pela claridade solar. O mestre, indicando-as, disse:
Aqui, as pétalas puras conservaram o dom celeste com absoluta fidelidade e, muito em
breve, serão perfume e beleza em excelentes frutos para o banquete da vida.
Logo
após, espraiando o olhar pela paisagem enorme, falou ao discípulo espantado:
Jamais censures o manancial do socorro celeste. Cada homem lhe recebe o valor no plano em
que se encontra. Guardando-lhe os princípios sublimes, o criminoso se faz menos cruel, o
pior se mostra menos mau, o imperfeito melhora, o infortunado encontra alívio e os bons
se engrandecem para maior amplitude no serviço ao Nosso Pai. Se possuis raciocínio
suficiente para discernir a realidade, não te percas em reprovações vazias. Aprende com
o Supremo Senhor que ajuda sempre, de acordo com a posição e a necessidade de cada um, e
distribui com todos os que te cercam os bens do Céu que já podes reter com fidelidade e
o Céu te abrirá o acesso a tesouros sem-fim...
Terminada
que foi a narrativa, Jesus calou-se.
Os
apóstolos, como se houvessem recebido sublime lição em tão poucas palavras,
entreolharam-se, expressivamente, silenciosos e felizes.
O
Senhor, então, abençoou-os e retirou-se para as margens do lago, fitando, pensativo, as
constelações que tremeluziam distantes...
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Aberta a
doce conversação da noite, em torno da Boa Nova, a esposa de Zebedeu perguntou,
reverente, dirigindo-se a Jesus:
Senhor, como se verificará nossa jornada para o Reino Divino?
O Cristo
pareceu meditar alguns momentos e explanou:
Num vale de longínquo país, alguns judeus cegos de nascença habituaram-se à treva e à
miséria em que viviam, e muitos anos permaneciam na furna em que jaziam mergulhados,
quando iluminado irmão de raça por lá passou e falou-lhes da profunda beleza do Monte
Sião, em Jerusalém, onde o povo escolhido adora o Supremo Pai. Ao lhe ouvirem a
narrativa, todos os cegos experimentaram grande comoção e lastimaram a impossibilidade
em que se mantinham. O vidente amigo, porém, esclareceu-lhes que a situação não era
irremediável. Se tivessem coragem de aplicar a si mesmos determinadas disciplinas, com
abstinência de variados prazeres de natureza inferior a que se haviam acostumado nas
trevas, poderiam recobrar o contacto com a luz, avançando na direção da cidade santa.
A
maioria dos ouvintes recebeu as sugestões com manifesta ironia, assegurando que os
progenitores e outros antepassados haviam sido igualmente cegos e que se lhes afigurava
impossível a reabilitação dos órgãos visuais.
Um
deles, porém, moço corajoso e sereno, acreditou no método aconselhado e aplicou-o.
Entregou-se
primeiramente às disciplinas apontadas e, depois de quatro anos de meditações, trabalho
intenso e observação pessoal da Lei, com jejuns e preces, obteve a visão.
Quase
enlouqueceu de alegria.
Em
êxtase, contou aos companheiros a sublimidade da experiência, comentando a largueza do
céu e a beleza das árvores próximas; contudo, ninguém acreditou nele.
Não
obstante ser tomado por demente, o rapaz não desanimou.
Agora,
enxergava o caminho e conseguiria avançar.
Ausentou-se
do vale fundo, mas, sem qualquer noção de rumo, vagueou dias e noites, em estado
aflitivo. Atacado por lobos e víboras em grande número, usava a maior cautela,
reconhecendo a própria inexperiência, até que, em certa manhã, abeirando-se de um
esconderijo cavado na rocha, para colher mel silvestre, foi aprisionado por um ladrão que
lhe exigiu a bolsa; entretanto, como não possuísse dinheiro, deixou-se escravizar pelo
malfeitor que durante cinco anos sucessivos o reteve em trabalho incessante. O servo,
porém, agiu com tamanha bondade, multiplicando os exemplos de abnegação, que o
espírito do perseguidor se modificou, fazendo-se mais brando e reformando-se para o bem,
restituindo-lhe a liberdade.
Emancipado
de novo, o crente fiel recomeçou a jornada, porque a ânsia de alcançar o templo divino
povoava-lhe a mente.
Pôs-se
a caminho, distribuindo fraternidade e alegria com todos os viajores que lhe cruzassem a
estrada, mas, atingindo um vilarejo onde a autoridade era exercida com demasiado rigor,
foi encarcerado como sendo um criminoso desconhecido; no entanto, sabendo que seria
traído pelas próprias forças insuficientes, caso buscasse reagir, deixou-se trancafiar
até que o problema fosse resolvido, o que reclamou longo tempo. Nunca, entretanto, se
revelou inativo no exercício do bem. Na própria cadeia que lhe feria a inocência,
encontrou vastíssimas oportunidades para demonstrar boa-vontade, amor e tolerância,
sensibilizando as autoridades, que o libertaram enfim,.
O ideal
de atingir o santuário sublime absorvia-lhe o pensamento e prosseguiu na marcha; todavia,
somente depois de vinte anos de lutas e provas, das quais sempre saía vitorioso, é que
conseguiu chegar ao Monte Sião para adorar o Supremo Senhor.
O Mestre
interrompeu-se, vagueou o olhar pela sala silenciosa e rematou:
Assim é a caminhada do homem para o Reino Celestial.
Antes de
tudo, é preciso reconhecer a sua condição de cego e aplicar a si mesmo os remédios
indicados nos mandamentos divinos. Alcançado o conhecimento, apesar da zombaria de
quantos o rodeiam em posição de ignorância, é compelido a marchar por si mesmo, e
sozinho quase sempre, do escuro vale terrestre para o monte da claridade divina,
aproveitando todas as oportunidades de servir, indistintamente, ainda mesmo aos próprios
inimigos e perseguidores. Quando o seguidor do bem compreende o dever de mobilizar todos
os recursos da jornada, em silêncio, sem perda de tempo com reclamações e censuras, que
somente denunciam inferioridade, então estará em condições de alcançar o Reino,
dentro do menor prazo, porque viverá plasmando as próprias asas para o vôo divino,
usando para isso a disciplina de si mesmo e o trabalho incessante pela paz e alegria de
todos.
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Na
véspera da partida do Senhor, no rumo de Sídon, o culto do Evangelho, na residência de
Pedro, revestiu-se de justificável melancolia. As atividades do estudo edificante
prosseguiriam, mas o trabalho da revelação, de algum modo, experimentaria interrupção
natural.
A
leitura de comoventes páginas de Isaías foi levada a efeito por Mateus, com visível
emotividade; entretanto, nessa noite de despedidas ninguém formulou qualquer indagação.
Intraduzível
expectativa pairava no semblante de todos.
O
Mestre, por si, absteve-se de qualquer comentário, mas, ao término da reunião, levantou
os olhos lúcidos para o Céu e suplicou fervorosamente:
Pai, acende a Tua Divina Luz em torno de todos aqueles que Te olvidaram a bênção, nas
sombras da caminhada terrestre.
Ampara
os que se esqueceram de repartir o pão que lhes sobra na mesa farta.
Ajuda
aos que não se envergonham de ostentar felicidade, ao lado da miséria e do infortúnio.
Socorre
os que se não lembram de agradecer aos benfeitores.
Compadece-te
daqueles que dormiram nos pesadelos do vício, transmitindo herança dolorosa aos que
iniciam a jornada humana.
Levanta
os que olvidaram a obrigação de serviço ao próximo.
Apiada-te
do sábio que ocultou a inteligência entre as quatro paredes do paraíso doméstico.
Desperta
os que sonham com o domínio do mundo, desconhecendo que a existência na carne é simples
minuto entre o berço e o túmulo, à frente da Eternidade.
Ergue os
que caíram vencidos pelo excesso de conforto material.
Corrige
os que espalharam a tristeza e o pessimismo entre os semelhantes.
Perdoa
aos que recusaram a oportunidade de pacificação e marcham disseminando a revolta e a
indisciplina.
Intervém
a favor de todos os que se acreditam detentores de fantasioso poder e supõem loucamente
absorver-te o juízo, condenando os próprios irmãos.
Acorda
as almas distraídas que envenenam o caminho dos outros com a agressão espiritual dos
gestos intempestivos.
Estende
paternas mãos a todos os que olvidaram a sentença de morte renovadora da vida que a tua
lei lhes gravou no corpo precário.
Esclarece
os que se perderam nas trevas do ódio e da vingança, da ambição transviada e da
impiedade fria, que se acreditam poderosos e livres, quando não passam de escravos,
dignos de compaixão, diante de teus sublimes desígnios.
Eles
todos, Pai, são delinqüentes que escapam aos tribunais da Terra, mas estão assinalados
por Tua Justiça Soberana e Perfeita, por delitos de esquecimento, perante o Infinito
Bem...
A essa
altura, interrompeu-se a rogativa singular.
Quase
todos os presentes, inclusive o próprio Mestre, mostravam lágrimas nos olhos e, no alto,
a Lua radiosa, em plenilúnio divino, fazendo incidir seus raios sobre a modesta vivenda
de Simão, parecia clamar sem palavras que muitos homens poderiam viver esquecidos do
Supremo Senhor; entretanto, o Pai de Infinita Bondade e de Perfeita Justiça, amoroso e
reto, continuaria velando...